"Há muito tempo que não escrevo. Têm passado meses sem que viva, e vou durando, entre o escritório e a fisiologia, numa estagnação íntima de pensar e de sentir. Isto, infelizmente, não repousa: no apodrecimento há fermentação.
Há muito tempo que não só não escrevo, mas nem sequer existo. Creio que mal sonho. As ruas são ruas para mim. Faço o trabalho do escritório com consciência só para ele, mas não direi bem sem me distrair: por detrás estou, em vez de meditando, dormindo, porém estou sempre outro por detrás do trabalho.
Há muito tempo que não existo. Estou sossegadíssimo. Ninguém me distingue de quem sou. Senti-me agora respirar como se houvesse praticado uma coisa nova, ou atrasada. Começo a ter consciência de ter consciência. Talvez amanhã desperte para mim mesmo, e reate o curso da minha existência própria. Não sei se, com isso, serei mais feliz ou menos. Não sei nada. Ergo a cabeça de passeante e vejo que, sobre a encosta do Castelo, o poente oposto arde em dezenas de janelas, num revérbero alto de fogo frio. À roda desses olhos de chama dura toda a encosta é suave do fim do dia. Posso ao menos sentir-me triste, e ter a consciência de que, com esta minha tristeza, se cruzou agora - visto com ouvido - o som súbito do eléctrico que passa, a voz casual dos conversadores jovens, o sussurro esquecido da cidade viva.
Há muito tempo que não sou eu."
8-1-1931 - B.S. (L.d.D.) - (F.P.)
... z(?)
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12 comentários:
"O coração, se pudesse pensar, pararia."
B.S. - LdD
"(...) Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los
E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.
Sigo o fumo como uma rota própria,
E gozo, num momento sensitivo e competente,
A libertação de todas as especulações
E a consciência de que a metafísica é uma consequência de estar maldisposto.
Depois deito-me para trás na cadeira
E continuo fumando.
Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando.(...)"
AC - T
beijos a
Abençoado Livro do Desassossego que propiciou o teu regresso.
Jinhos Amenos
levantar, comer, dormir...
levantar, comer, dormir...
mas tento dar importância, tirar prazer, das pequenas coisas insignificantes que me acontecem durante cada vinte e quatro horas.
como por exemplo vir aqui e ver que passaste por cá...
para ti um grande abraço.
e eu lembrei me de uma frase de uma musica
"i'm not living, i'm just killing time."
*
@Mano: Tens que me emprestar isso... Volta não volta sinto o mesmo ao olhar pelas janelas nas aulas de DC, até ao pormenor do som do eléctrico e da encosta do Castelo ;) .
@a prinçusa: Grande, grande música! :)
mas o que foi que te aconteceu????????????????
escritório?
É isso?
não pode ser! E a tua música????
assim...............morres!
ao menos... nos entrevalos, pensa nela... (olha, em Salzburg , ouvi um clarinetista da Berlin Phil. excelente, novinho mas alegre. Falei com ele e tinha esperança, muita esperança, mesmo no difícil, falei... muito com ele!...de coisas como as que decreves)
Arrebita, Z.
Bach não te perdoaria.................
olha,
um pequeno presente para ti:
http://youtube.com/watch?v=bal1gRVvyJU
Segundo o MJV, o FP bebia bagaco... porque será...?
Abracos
Dá noticias
um abraço
mas o que é que aconteceu a este blog?
Z deixaste a música?
diz-me que não,
por
favor ..............
Volto sp aqui... à procura dum "sopro" barroco...
os teus fãs
têm saudades
tuas !!!
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