Escrever, qualquer coisa, sem muita importância, sem
importância nenhuma, sem pensar em que importância possa ter o que escrevo. Sem
um plano pré-definido, nem uma opção estilística, formal, estética, metafísica,
ideológica, nada! Escrever mesmo só porque sim. Escrever para relembrar, aliás,
para testar o que ainda lembro, o que não esqueci ainda. Ou para desconstruir o
próprio esquecimento. Escrever porque escrever faz bem e porque tenho a noção
de que o posso fazer bem também. Aliterar como quem o faz casualmente mesmo
quando intuo que alitero com toda a consciência dormente de que já aliterei no
passado e por isso posso voltar a aliterar. Rebuscar nas frases o rendilhado de
outras vidas, de outras fases da vida, de outras frases rebuscadas. Escrever como
quem grita porque não gritar já não é possível. Escrever antes que expluda ou,
pior ainda, antes que impluda. Escrever para perceber que as diferenças entre
conceitos opostos podem na verdade não existir e que os círculos se fecham
mesmo. Escrever, escrever, escrever, contra a corrente, a favor dela, contra o
vento e ao sabor dele, contra tudo e a favor de tudo e o mesmo para os nadas
todos! Estragar frases pela ausência do seu sentido e esperar em vão que as
frases sem sentido encerrem em si as verdades mais importantes, como esta de
não haver verdades nenhumas nem sequer sentido, nem sentidos, nem nada. E que
por isso mesmo é que existe tudo e que como tudo é nada e isso tudo, é tudo bom
e é tudo mau exactamente ao mesmo tempo e em igual medida. Escrever para ser eu
e para ser outras coisas que não eu e para ser o que não tenho coragem de ser
senão na escrita e sobretudo escrever para ter a coragem de ser aquilo que todos
os medos acumulados desde que os medos existem me querem impedir que eu seja e
a que tenho direito por ser exactamente como sou, querendo ser sempre outro.
Escrever para ler, escrever para não ler, escrever para ser lido, escrever aqui
que não me importa se me lêem ou não quando é evidente que me importa e até sei
quem vai ler e quem não vai e é também por isso que escrevo. Tenho escrito. Enfim,
escrever porque sim, sim e sim.
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1 comentário:
Ainda andas por Amesterdão?
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