terça-feira, março 16, 2010

Original

Alguém que pegue em todos os pedaços
espalhados
E pinte o quadro completo
e acabado.
Alguém que leia todas as palavras
avulsas
e recomponha a narrativa, a epopeia
esquiva.
Alguém que compreenda todas as ideias
obtusas
e traduza, explique sem mais
equívocos.
Alguém que registe todos os sons
secretos
e componha finalmente
a sinfonia.
(ou a banda sonora para uma vida)

Energized

Pure energy, pure,
just movements of something
bigger than any of us,
just gestures, words longing
for mouths to rest upon,
effects rushing to preceed the cause
of their own blossoming.
Light twirling particles
in eyes that relearnt to shine,
arms neither yours nor mine
but atoms renewed and intertwined.
Loneliness of two, now shared,
secrets and harmonies revealed,
energies and fireworks concealed
from those who cared.
Face, smiles, non-promisses,
virtues of vortexes slowed down,
scent of senses all around
in our burning bodies
like furnaces.
Peace, stillness, embrace,
rediscovering the pace
of slow, pure
energy

Felicidade

Queria reservar-me o direito a ser feliz...
...não, não é de novo isto desta vez...
Reservo-me sim o direito a ser feliz
e sou, quase sempre, feliz à força
de o ser, de o repetir até à exaustão.
Assim, de nada, como um impulso
planeado, na espontaneidade oca,
feliz de fé, só, sem razão
aparente. Crença, desejo, religião
sem Deus, da vida, da teimosia,
feliz sem causa, sem motivo
(enfim, às vezes sim, outras vezes não).
Assim só, feliz, vivo,
à espera sem espera de um novo dia
feliz

terça-feira, março 02, 2010

Pretérito Passado

Descrevo o quanto te desconheço
(já)
quando queria descrever o quanto te conhecia
(ainda, sempre)
Penso na certeza de estares em algum lado
que não sei onde seja
De seres de uma forma
que se dilui
em sombras, névoas, muros invisíveis
Distâncias de repente inalcançáveis

Proximidades inconcebíveis
Descrevo o cunho desse real tangível
muito mais nítido do que tudo
muito mais verdadeiro
(na dúvida de tudo...
que se esfuma)
Divago no tempo que me foge
Que me fugia
Que talvez nunca tenha existido
nunca tenha passado

ou tenha sido sempre
tudo

e não pare de passar
Como essas memórias que se diz que ficam
e não ficaram
Como certezas de poeira ao vento
que voaram
Como dúvidas
incertezas
vazios




Pretérito Presente

Sim, sei, sou, vivo
Transformaste-te em poesia,
já não és pessoa
és ideias
Transformaste-te nas palavras,
nas que escreveste
e em todas as que ficaram por escrever
Talvez não, não saiba
Turbilhão, redemoinho de nós próprios,
mesmos, sempre, outros,
constantemente
Turbilhonaste-te nos meandros
dos pretéritos todos
e em ti
Sei, sou, vivo, sim
Sim, sim, mil vezes sim
e sempre, sem dúvida
incondicionalismo possível
Sim, sempre, até ao infinito,
crença, dogma, fé sem fé
até que tudo seja negado.
Não, afinal não
Afinal dúvidas circulares,
vícios em círculos
redondos, concêntricos
Afinal restos de pedaços
de fragmentos de fracções
de ti
Som, vivo, sim, sei, sou
eu Auto-, entre, mim, meu
mas devias ter sido tu
podias ter sido
Eu. Tu, és mesmo tu, teu
Persistência de uma memória
Onde estás?
Não, sim, não
Nunca, sempre, para nunca
Nada
E tudo o que entre si medeia



Pretérito Futuro

Não foste ainda, és paradoxo do por-vir,
provavelmente não serás nunca aquilo que foste
enquanto fores sempre de novo construída.
Idealização do tempo que não murchou ainda,
viço do desejo intocado pela vida,
carregando o peso original de um pretérito desconhecido
que há-de ser, há-de cumprir-se em ti.
Futuro feito de turbilhões, de névoas, sombras
que não foram no tempo inexorável.
Carga desonesta de um futuro instável,
de um presente que não é, sendo,
de um pretérito parado, fugidio
e eterno